Governo do Estado do Rio Grande do Sul
Início do conteúdo

DPE/RS ajuíza ação civil pública contra convênio que está colocando DIU em meninas abrigadas

Publicação:

20180918173859defensoria_materias.jpg
DPE/RS ajuíza ação civil pública contra convênio que está colocando DIU em meninas abrigadas - Foto: Divulgação / Ascom DPERS

Porto Alegre (RS) – A Defensoria Pública do Estado do Rio Grande do Sul (DPE/RS), juntamente com a Defensoria Pública da União (DPU) e a ONG Thêmis – Gênero, Justiça e Direitos Humanos, ajuizou uma ação civil pública pedindo a suspensão da colocação de Sistema Intrauterino Liberador de Levonorgestrel 20mcg (SIU) em meninas inseridas no programa de atendimento institucional de Porto Alegre. A disponibilização do método contraceptivo faz parte de um Termo de Cooperação firmado entre Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul (MP/RS), município de Porto Alegre, Hospital de Clínicas de Porto Alegre, Hospital Materno-Infantil Presidente Vargas e Bayer S/A, réus da ação. De acordo com o Defensor Público Rodolfo Lorea Malhão, um dos signatários da ação, além de a proposta não ter sido debatida com a sociedade civil, há flagrante violação dos direitos das adolescentes envolvidas.

O Termo de Cooperação, que tem como objetivo disponibilizar às jovens inseridas no programa de acolhimento institucional de Porto Alegre o acesso a uma política de saúde e de planejamento reprodutivo de maior eficácia e de longa duração, foi firmado em 6 de junho. Nele, está previsto que o MP/RS e as entidades de acolhimento selecionam as adolescentes, enquanto que a Secretaria Municipal de Saúde da Capital agenda a consulta nos hospitais parceiros, a quem compete a avaliação clínica das jovens, a colocação do dispositivo e uma reconsulta em 45 dias. A Bayer, por sua vez, fica comprometida de fornecer, gratuitamente, no mínimo 60 dispositivos e de treinar as equipes dos hospitais.

Os problemas apontados na ação
Segundo a Defensora Pública Larissa Rocha Ferreira Caon, que também assina a ação civil pública, um relatório da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (Conitec) concluiu que as evidências científicas apresentadas não foram suficientes para comprovar a superioridade da tecnologia proposta comparada àquelas disponibilizadas no Sistema Único. “Esta decisão, que é administrativa, pode ser questionada, inclusive pelo MP. O Ministério Público, os hospitais e empresas particulares não têm autorização legal para criar políticas de saúde paralelas às políticas públicas, que são formuladas após amplo debate com a sociedade civil e entidades da área da saúde”, explicou.

Outro problema apontado pela DPE é que o termo não informa sobre o acompanhamento das jovens, após a colocação do dispositivo. O SIU tem durabilidade de até cinco anos, devendo ser substituído após esse período. Além disso, o acompanhamento por médico ginecologista deve ser feito anualmente. “O convênio não prevê estes detalhes, nem dispõe sobre a possibilidade de retirada a qualquer tempo. Nestes cinco anos, as adolescentes podem ser desligadas das instituições de acolhimento, caso sejam adotadas, retornem às famílias de origem ou atinjam a maioridade civil. Esse acompanhamento fora das entidades não está previsto. Além disso, como elas procurariam auxílio do SUS se o dispositivo não faz parte da sua política de saúde?”, questiona a Defensora Pública Fabiane Lontra, terceira signatária da ação civil pública, pela DPE.

De acordo com os Defensores, o Termo de Cooperação também viola os preceitos da política nacional de direitos sexuais e reprodutivos, ao focar em uma ação de disponibilização de um único método contraceptivo em detrimento de uma política de promoção de saúde sexual e reprodutiva. Conforme trecho da ação, “o Ministério Público trata os indivíduos sob sua tutela como objetos de intervenção estatal e não como sujeitos de direitos. Ao preocupar-se exclusivamente com a não gravidez, descuida-se da promoção de sua saúde desde uma perspectiva ampla de educação sexual e reprodutiva, do cuidado de si e do empoderamento dos sujeitos para tomada de decisões livres e informadas”. Para estar de acordo com os princípios elencados no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), nenhuma iniciativa de contracepção para adolescentes deverá vir desacompanhada de educação sexual e escolha livre e informada acerca do método eleito.

Outra atitude criticada na ação civil pública foi a forma como os termos de consentimento foram coletados pelo MP. Anunciando uma palestra sobre o assunto, a entidade enviou os termos, por e-mail, aos abrigos, pedindo que estes fossem entregues já assinados no dia da palestra. “Além de as adolescentes não estarem em condições de consentir, pela menoridade civil e pelas vulnerabilidades social e de restrição de direitos, não lhes foi apresentado o método de maneira individual e personalizada. Dessa forma, entende-se que os consentimentos são inválidos”, explica Malhão.

Uma adolescente de 15 anos, assistida da DPE, que estava em internação psiquiátrica após tentativa de suicídio, foi uma das jovens que assinou o consentimento. No entanto, após a alta, ela afirmou que não concordou com a colocação do SIU, que não deu seu consentimento, que sequer leu o documento que assinou, que não recebeu mínimas informações sobre o método e que recebeu apenas uma consulta médica para tratar sobre a colocação do dispositivo.

Mobilização
A sociedade civil passou a se mobilizar contra o Termo de Cooperação, lançando notas de repúdio. Entre as que se manifestaram, estão o Conselho Estadual da Criança e do Adolescente (Cedica), Conselho Municipal de Saúde de Porto Alegre (CMS/POA), o Conselho Estadual de Assistência Social (Ceas), Conselho Regional de Serviço Social, Conselho Regional de Psicologia e Conselho Regional de Enfermagem. “Nós concordamos que devam existir políticas para prevenção da gravidez na adolescência, mas não podemos concordar com um programa que utiliza jovens em situação de vulnerabilidade como cobaias de um método que sequer foi aceito pelo Poder Público”, defende o Dirigente do Núcleo de Defesa da Criança e Adolescente da DPE, Jonas Scain Farenzena.

A ação civil pública pede a suspensão imediata do convênio, informações sobre quantos dispositivos já foram implantados, a possibilidade de retirada gratuita para aquelas que desejarem, indenização por danos morais e materiais, além de prestação de todo atendimento de saúde necessário às adolescentes.

 

Texto: Camila Schäfer/Ascom DPERS
Defensoria Pública do RS
Assessoria de Comunicação Social
http://www.defensoria.rs.def.br/
Twitter: @_defensoriaRS
Facebook.com/defensoriars

Defensoria Pública do Estado do Rio Grande do Sul