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Defensoria Pública é responsável por quase metade dos recursos apresentados em instâncias superiores

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Juiz batendo um martelo
Defensoria Pública é responsável por quase metade dos recursos apresentados em instâncias superiores - Foto: boonchai wedmakawand / Getty Images
Por Fonte: Site Época

Brasília (DF) – Embora seja apontado como um privilégio para criminosos ricos, capazes de pagar grandes bancas de advogados, os recursos nos tribunais superiores nunca estiveram tão acessíveis a réus pobres. Segundo dados de 2018 do Superior Tribunal de Justiça (STJ), 45% dos habeas corpus e 40% dos recursos no tribunal são apresentados pela Defensoria Pública. Criada pela Constituição Federal de 1988, o órgão é responsável por prestar assistência jurídica gratuitamente a pessoas necessitadas.

Como padrão de comparação, São Paulo tem 332.900 advogados e apenas 749 defensores públicos. Além disso, a atuação da maioria das Defensorias Públicas é recente. No estado, que é a origem da maior parte dos processos nos tribunais superiores, a Defensoria só só foi implementada em 2006.

A suposta dificuldade do acesso aos tribunais superiores por réus pobres é apontada por defensores da prisão após condenação em segunda instância como uma das justificativas para o início do cumprimento da pena após duas condenações.

Os números divulgados pelo STJ indicam, no entanto, que não apenas os recursos dos réus mais pobres, atendidos pela Defensoria Pública, chegam a Brasília como também eles costumam ser alvos de mais constrangimentos ilegais do que os clientes atendidos por advogados: os ministros do tribunal concederam 35% dos habeas corpus pedidos pelos defensores públicos de 2015 a 2017. Mesmo apresentando menos habeas corpus ao todo, os advogados tiveram mais pedidos negados que as Defensorias e a metade da taxa de sucesso: 17%.

Para o defensor público Rafael Muneratti, os números apontam que os réus mais pobres dependem muito mais dos recursos nos tribunais superiores para corrigir erros nas duas primeiras instâncias. Muneratti foi um dos defensores públicos encarregados de realizar a sustentação oral no Supremo Tribunal Federal no processo que analisa a possibilidade de prisão após condenação em segunda instância.

"Esse número não indica que o defensor é melhor que o advogado. Indica que quem procura a Defensoria sofre mais constrangimentos ilegais. A maioria da injustiça está nas parcelas mais pobres, que não têm dinheiro para pagar advogado", afirmou o defensor público.

A mesma proporção de sucesso para as Defensorias acontece nos recursos apresentados ao STJ, isto é, já após duas condenações.

Nos recursos apresentados pelos advogados, houve absolvição em 0,62% dos casos. Mas quando a Defensoria é a solicitante, o número vai a 1,19%. Além disso, em 12% dos casos liderados pela Defensoria houve diminuição da pena e em 8%, alteração do regime prisional — quando o réu deixa o regime fechado e vai para o semiaberto, por exemplo.

No caso dos pedidos em forma de habeas corpus , o STJ concedeu para a Defensoria Pública a alteração para o regime semiaberto em 12,50% dos casos e diminuição da pena em 16%.

"A ideia de que os pobres não chegam aos tribunais superiores não corresponde à realidade. Pode ser que isso fizesse sentido há uns 10, 20 anos. De 2001 para cá, aumentou o número de defensores públicos e as pessoas começaram a ter acesso aos tribunais superiores", afirmou Muneratti.

Em pesquisa feita em 2015 sobre os pedidos de habeas corpus nos tribunais superiores, o professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Thiago Bottino, identificou que boa parte da razão dos recursos apresentados após condenações em segunda instância se deve ao desrespeito, nas instâncias inferiores, a jurisprudências consolidadas nos tribunais superiores. O maior responsável pelo enorme número de recursos que chegam à terceira instância é o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP).

Boa parte dos recursos diz respeito ao crime de roubo e ao regime inicial de cumprimento da pena, explica Bottino. Segundo entendimento do STF, o regime fechado só é decretado automaticamente quando a pena é maior do que oito anos.

"Só pode colocar em regime fechado quando a pena for abaixo de oito anos se houver uma justificativa. Mas o TJ-SP condena a quatro, cinco, seis anos, coloca no regime fechado e não justifica. O STJ modifica tudo isso", afirmou.

A insistência dos juízes e dos desembargadores do Tribunal em enviar para o regime fechado, sem justificativa, réus condenados a menos de oito anos de prisão, leva a uma avalanche, segundo Bottino, de casos no STJ e no Supremo.

A visão é compartilhada por Muneratti. Para o defensor, caso as instâncias inferiores respeitassem decisões do Supremo, não haveria necessidade para o número de recursos que chegam a Brasília.

"Se os tribunais simplesmente cumprissem a jurisprudência e as súmulas, haveria muito menos necessidade de levar o processo para os tribunais superiores. Nós só levamos quando sabemos que tem chance de ganhar. A Defensoria faz uma defesa completa, mas racional: ninguém faz recursos à toa", disse.

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